ESTADÃO • 06 de março de 2025
Fonte da Notícia: ESTADÃO
Data da Publicação original: 27/02/2025
Publicado Originalmente em: https://www.estadao.com.br/educacao/residencia-ou-especializacao-medicos-buscam-novas-alternativas-no-mercado/
O cenário da educação médica no Brasil tem passado por transformações significativas nos últimos anos. Segundo o Censo da Educação Superior de 2023, o País conta com 389 cursos de Medicina, sendo o segundo maior do mundo, atrás apenas da Índia. O número de médicos ativos quase dobrou entre 2010 e 2024, passando de 304.406 para 575.930, de acordo com o Conselho Federal de Medicina (CFM).
No entanto, esse crescimento acelerado esbarra em um desafio significativo: a falta de vagas em residência médica. Em 2024, foram disponibilizadas 16.189 vagas de acesso direto, número insuficiente para absorver os 27.263 recém-formados, deixando milhares de profissionais sem especialização. Além disso, uma parcela expressiva dos novos médicos sequer presta a prova de residência, optando por outras formas de aperfeiçoamento profissional.
A residência médica exige uma carga horária de aproximadamente 60 horas semanais, dedicação exclusiva e uma bolsa mensal de cerca de R$ 4.100,00, o que se torna inviável para muitos profissionais que já possuem outras atividades ou não podem abdicar de uma remuneração maior.
Por que a especialização se tornou uma alternativa?
“Apesar de a graduação em Medicina ser uma das mais longas entre as profissões de nível superior, ela não é suficiente para preparar completamente o profissional para os desafios da carreira”, explica o Dr. Guilherme Succi, coordenador do curso de Medicina da Faculdade São Leopoldo Mandic.
Segundo ele, a formação contínua é uma necessidade e pode ser realizada de diversas maneiras, incluindo residência, pós-graduação, cursos de capacitação e especialização
Embora a residência médica seja a principal referência para especialização no Brasil, a pós-graduação médica tem ganhado espaço ao oferecer um modelo mais flexível e acessível. Diferente da residência, que segue um formato hospitalar com supervisão intensa, a pós-graduação permite que o médico continue exercendo suas atividades enquanto aprimora seus conhecimentos.
E é justamente nesse contexto que instituições de ensino ligadas a hospitais renomados, como Einstein e Sírio-Libanês, vêm ganhando destaque. Essas instituições aproveitam sua expertise hospitalar e a qualidade de seus professores para oferecer formações especializadas e alinhadas às necessidades do mercado.
O diferencial das especializações ligadas a hospitais
Nathalia Dias escolheu um caminho diferente da residência médica após se formar. Para ela, a especialização foi uma alternativa de crescimento profissional, especialmente na área de gestão da saúde. Em 2020, concluiu uma pós-graduação no Einstein e, hoje, trabalha no Hospital Municipal Gilson de Cássia Marques de Carvalho, uma parceria público-privada do Einstein. Ela destaca os impactos dessa escolha:
“O curso me deu um olhar mais estratégico sobre a saúde. Pude aplicar conceitos de gestão tanto no setor público quanto no privado, com resultados positivos.”
A aplicação imediata dos conhecimentos adquiridos é um dos principais atrativos das especializações, permitindo que os profissionais se destaquem em um mercado cada vez mais competitivo. Além disso, a presença de alunos de diferentes áreas amplia o networking e favorece trocas interdisciplinares, essenciais para um setor que exige múltiplas expertises.
Outra vantagem dos programas oferecidos por hospitais de referência é a imersão no ambiente clínico real. No Einstein, por exemplo, os alunos participam de vivências hospitalares e têm contato direto com especialistas renomados.
Flavia Nielsen, Head de MBA e Pós-graduação em Gestão do Einstein, reforça esse diferencial. Além das aulas, são realizadas imersões no hospital, proporcionando contato direto com gestores e especialistas.
“Essa experiência prática permite que os estudantes não apenas adquiram conhecimento teórico, mas também compreendam os desafios e soluções do setor de saúde na vida real”, explica.
O Hospital Israelita Albert Einstein oferece atualmente dois MBAs, 120 títulos de especialização assistenciais e 26 títulos em gestão. A instituição iniciou sua jornada no ensino em 1989 com a inauguração da Faculdade de Enfermagem e da Escola Técnica.
Desde então, o Einstein tem expandido constantemente sua oferta educacional, com a criação do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (IIEP) em 1998 e o estabelecimento do Centro de Educação em Saúde Abram Szajman em 2004. Este crescimento culminou na abertura da Faculdade de Medicina em 2016, marcando um importante marco na história da instituição.
No caso do Hospital Sírio-Libanês, a oferta de cursos de especialização está diretamente conectada à expertise da instituição em determinadas áreas. Segundo Luiz Fernando Lima Reis, diretor de Ensino e Pesquisa do Sírio-Libanês, a base do ensino está na produção de conhecimento:
“Estar envolvido na geração de conhecimento, ter pesquisa, expertise e ser referência no tema é condição sine qua non para oferecermos um bom programa de ensino.”
O que diferencia a residência da especialização?
Reis ressalta que residência médica e especialização são conceitos distintos. A residência é um processo de aprimoramento da formação médica, no qual o aluno desenvolve habilidades e competências em áreas específicas. Já a especialização aprofunda o conhecimento em um nicho específico.
Apesar disso, há cursos voltados a recém-formados, como especialização em atenção primária e gestão em saúde. Com o aumento no número de médicos formados e a limitação de vagas em programas de residência, muitos profissionais buscam especializações como alternativa.
No entanto, Reis alerta que a especialização não deve substituir a residência médica, pois sua estrutura não contempla o aprendizado prático essencial para a atuação médica.
“Alguns cursos de especialização são vendidos como substitutos da residência, mas não possuem a mesma abordagem. A residência oferece um aprendizado baseado no serviço, onde o residente aprimora suas habilidades enquanto trabalha diretamente com pacientes. Já a especialização tem um foco mais técnico e teórico, enfatizando aspectos específicos da profissão.”
Essa distinção reforça a importância de avaliar cuidadosamente os caminhos de formação, considerando tanto os objetivos profissionais quanto a necessidade de prática e experiência clínica para uma atuação médica de excelência.
Com a crescente demanda por formatos mais flexíveis de educação, espera-se que a pós-graduação médica continue a expandir sua relevância no mercado. No entanto, especialistas destacam que tanto a residência quanto a pós-graduação possuem papeis distintos e podem coexistir, atendendo diferentes perfis de profissionais.
“O cenário atual aponta para um mercado de formação médica mais diversificado, permitindo que cada profissional escolha o modelo que melhor se adequa às suas necessidades e expectativas de carreira”, conclui o coordenador do curso de Medicina da Faculdade São Leopoldo Mandic.